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Um simples sorriso

O poeta caminhava.

A primeira flor da primavera, desabrochava.

No quarteirão da frente, um homem o observava.

Olhando fixamente, aquele que se aproximava.

Com os olhos abertos, o mundo, o tal poeta apreciava.

Alguns instantes depois, o olhar dos dois se encontraram.

Com um leve chacoalhar de cabeça, se cumprimentaram.

Com aquele simples gesto do poeta, o homem se reservara.

Sua ideia era assaltar o poeta.

Agora, no caminho de casa, percebeu que com aquele simples sorriso.

Ambos se salvaram.

Um medo bobo

Eu tinha um medo.

Um medo bobo, mas ainda assim, um medo.

Medo de depois de tanto tempo.

Decepcionar-me com tudo.

 

Eu tinha um medo.

Um medo bobo, mas ainda assim, um medo.

Medo de que aquele filme não fosse mais tão profundo.

Medo de que tudo aquilo não fosse tão genial.

Medo de que aquela música não me emocionasse mais.

 

Meu medo realmente era bobo.

O filme continua profundo.

Cresceu minha lista de geniais.

E agora, a música emociona-me ainda mais!

 

Lembranças do som metálico

Lembro-me do som metálico daquela noite.

Inicialmente não compreendi o que se passava.

O motivo de tudo aquilo me faltava.

 

Lembro-me do som das buzinas de outra noite.

Carros passavam. Seus faróis piscavam.

Realmente era uma afronta tudo aquilo que se passava.

 

Lembro-me daqueles dias de união.

Todos com a camisa da seleção.

Bandeiras nacionais, essas, tinha de montão.

 

Lembro-me do discurso de então.

Abaixo a corrupção!

Nós, não vamos pagar o pato não!

 

Parece que agora…

O discurso desapareceu.

As camisetas estão guardadas.

As buzinas andam caladas.

E as panelas? Ah, como é bom o cheiro de cebola refogada.

Estrangeiro

Longe de casa, você é estrangeiro.

Mesmo que te aceitem, você continua sendo estrangeiro.

Quando você fala, ninguém tem dúvida, você é estrangeiro.

Pelo jeito que você age, a coisa fica clara, você é estrangeiro.

A forma com a qual você se expressa, te entrega, você é estrangeiro.

Algumas pessoas perguntam, até quando você vai ser estrangeiro?

Penso comigo baixinho.

Mesmo se eu voltar, vou continuar sendo estrangeiro.

Quando eu morrer

Quando eu morrer, não precisa chorar.

Digo, se quiser chorar, chore, mas não por mim, tenha certeza que bem vou estar.

Se um dia eu lhe fiz sorrir, minha vida valeu a pena e, portanto, não há motivo para chorar.

Se nunca lhe dei alegria, não chore, a falha foi minha e além do mais, pra que chorar?

Se um dia eu lhe disse algo que até agora está em sua garganta, fale agora e ficamos acertados.

Não precisa lamentar por não termos resolvido antes, algumas conversas ficam pra nunca mais.

Queria te pedir outra coisa agora.

Não me deixe aqui parado e depois me jogue debaixo da terra.

Sei que algumas coisas que não preciso mais podem fazer outras pessoas chorarem, de felicidade.

Tire tudo que é meu que pode ser útil para alguém.

Esse é o jeito que ainda tenho para fazer alguém sorrir.

Pegue o que sobrar e transforme em pó.

Me jogue, se puder, em mais de um lugar.

Por aí, vou continuar tentando me achar.

Num parque, num rio, numa rua, no mar.

Tenha certeza,

Cada pózinho de mim, algum dia

Vai encontrar seu lugar.

Fitzgerald Park

O céu azul, sem nuvens.

A calça, as blusas, a boina.

No caminho o sol contraía a pupila.

O nariz gelado conflitava com os olhos.

As mãos mergulhadas nos bolsos.

As folhas caídas pela calçada, pela rua, pelo parque.

O rio tremido pelo vento.

O chocolate quente.

O sol se pondo lá no fundo.

Outra folha resolve cair.

São 5 horas.

O Outono precisa sair.

E o Inverno,

Chegar!

O tempo não pára…

Hoje, limpando o banheiro de casa, ouvi de um novo jeito esta frase.

Estava escutando uma playlist no meu celular através de um aplicativo conectado à internet e que, via Bluetooth, enviava as músicas para uma pequena caixinha de som sobre o espelho do banheiro.

Em um determinado momento começou a tocar esta música de, na minha opinião, um dos maiores compositores brasileiros. Agenor de Miranda Araújo Neto, ou simplesmente Cazuza.

A bateria inconfundível na introdução de “O tempo não pára” me levou instantaneamente à minha infância e, esta “viagem”, me fez comparar os tempos atuais com a minha realidade no ano de seu lançamento, 1988.

A primeira comparação está no próprio nome. Atualmente “O tempo não pára” seria simplesmente “O tempo não para”. Uma singela alteração que nos mostra que algo, na língua portuguesa, foi alterado ao longo destas quase 3 décadas.

A segunda comparação é o modo como a música chegava aos meus ouvidos, estes também já com alguma diferença em relação a 1988.

Nos anos 80, eu ouvia esta música em um disco de Vinil, que tenho até hoje. Ele era reproduzido em um aparelho de som modular que era composto por um toca discos, um toca-fitas, um amplificador e duas caixas de som. Tudo isso conectado por um emaranhado de cabos ligando entradas e saídas e, obviamente, ligado a tomada para funcionar.

Além disso, para ouvir música, você precisaria ir até onde esta “parafernalha sonora” estivesse “repousada” e torcer para que ninguém estivesse ouvindo outra coisa.

Atualmente basta um celular com acesso à internet e pronto, você já tem a música que quiser, onde quiser e na hora que quiser. Sem a necessidade de conectar um único cabo.

Em relação ao próprio Cazuza, se o contágio do HIV tivesse ocorrido alguns anos mais tarde talvez ele ainda estivesse por aqui. Além dele Renato Russo, Freddie Mercury e mais alguns que fazem muita falta.

Em relação à minha interpretação da letra naquele tempo, “a piscina cheia de ratos” tinha o sentido literal. Um tanto amedrontador, mas eu visualizava uma piscina cheia de ratos e não compreendia como as ideias – que na época eram idéias – podiam não corresponder aos fatos, mas tudo bem, “o tempo não pára” e hoje talvez eu consiga compreender com um pouco mais de clareza, o que isso significa.

Os dias “de par em par” para mim talvez fosse algo simples de resolver, o mês teria 30 ou 31 dias “de verdade”, porém a contagem seria de 2 em 2. Seguindo esta lógica, teríamos, por exemplo, o dia 62 de Janeiro.

Hoje, pensando nesta frase, talvez eu entenda que a intenção dele fosse dizer que ele envelhecia 2 dias a cada dia, infelizmente, acho que o Renato Russo, em o “O Teatro dos Vampiros”, foi mais preciso. A cada hora que se passava, ele(s) envelhecia(m) 10 semanas.

“Nas noites de frio é melhor nem nascer
Nas de calor, se escolhe: é matar ou morrer
E assim nos tornamos, brasileiros.”

A primeira frase era muito fácil. No Brasil, quem precisaria nascer em uma noite de frio? Era só esperar mais um pouquinho que nasceria no calor.

As outras duas frases não faziam sentido afinal, ninguém nasce em condições de matar alguém e não precisaria disso para se tornar brasileiro. Bastava nascer no Brasil que este “problema” estaria resolvido.

É Cazuza, talvez ainda hoje eu não tenha conseguido entender, mas ser brasileiro é realmente amar o país apesar de tudo, e para isso, não precisa ter nascido nele.

O que pode ser mais passado, presente e futuro em 1988 ou em 2016 do que: “Te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro”.

Você só não acertou todos os adjetivos pois o tempo não parou e continuamos criando rótulos imbecis para aqueles que não tem o mesmo pensamento ou as mesmas atitudes que as nossas.

Hoje você seria também um coxinha ou um mortadela, um esquerdinha ou um direitinha.

Talvez, meu caro Agenor, você estivesse sendo bombardeado por críticas estupidamente ofensivas, com imagens de “Canetas Desesquerdizadoras” ou “Canetas Desdireitizadoras”, dependendo em qual “lado” você estivesse. Por ser filho de um executivo de uma grande empresa, seja lá qual fosse o seu lado, você seria um “tremendo de um hipócrita” que as pessoas fariam de tudo para te “humilhar”.

É meu querido poeta, infelizmente o debate está chegando ao fim, ninguém mais conversa para entender, discutir e chegar a uma conclusão. Atualmente as discussões tem um único objetivo: Humilhar!

Mas o objetivo, nas décadas de 1960, 1980 ou 2010, na nossa politica, é certamente o mesmo.
“Transformam o país inteiro num puteiro
Pois assim se ganha mais dinheiro”

É Agenor, no final da faxina, quando eu estava limpando o lixo da cozinha e ainda pensava na sua música que tinha ouvido 2 horas antes, ouvi outra grande música de Belchior na voz de Elis Regina que, infelizmente, complementa com primor suas ideias.

O tempo realmente não para mas, infelizmente, nós não mudamos. “Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais”.

Acho que o Brasil está mostrando tua cara como você pediu, mas ainda não sabemos quem vai pagar pr’a gente ficar assim!

O jovem pássaro

Cheguei em casa e ele estava ali, sobre a mesa em um pequeno pano.

Seus olhinhos piscavam lentamente.

O bico, ficava emergido na pequena tampa com água.

Saímos para jantar e ele ficou ali, deitadinho no tapete da sala.

Voltamos e decidimos deixar ele no quintal da frente.

Pensamos que a mãe dele viria buscá-lo.

Tomei banho pensando que amanhã ele não mais estaria ali.

Ela o buscaria e o ensinaria a voar.

Durante a semana, quando eu abrisse a mesma porta de onde o ví naquela noite.

Poderia pensar nele longe, voando e vendo o mundo do alto.

Estimulando sorrisos com seu canto.

Mas no dia seguinte, ele estava um pouco para o lado de onde havíamos deixado.

Caminhou alguns passos e parou.

Suas asas não bateram mais.

Seu canto fraco cessou.

O jovem pássaro por ali ficou.

 

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Infelizmente

O infeliz mente ou mente o infeliz?

A infeliz mente para sentir-se feliz?

A mente infeliz mente feliz?

Infeliz da mente que mente a si mesma.

Infeliz daquele que mente, mentindo ser feliz.

Infelizmente mentes mentirosas mentem felizes.

Uma mente feliz é infeliz na mente de quem mente.

Aquele infeliz na porta da igreja tem a mente demente e mesmo assim é feliz.

As mentes infelizes, felizmente ainda são mentes.

Feliz da mente que sabe ser feliz.

Feliz daquele que o infelizmente não está em sua mente.

Felizmente os felizes felicitam os infelizes tornando mais felizes suas mentes.

Felizmente os infelizes são pouco infelizes.

Felizes são aqueles que felizmente não sabem ser infelizes.

Infelizmente os felizes são poucos.

Infelizmente…